Reflexões sobre o Direito Militar

Está disponível para Kindle meu e-book com a coletânea de artigos sobre Direito Militar.

Espero que gostem, e comprem! 😀

Qual o impacto da terceirização da atividade fim?

https://ebradi.jusbrasil.com.br/noticias/616600452/stf-barroso-e-fux-defendem-a-licitude-da-terceirizacao-da-atividade-fim?utm_campaign=newsletter_ebradi_290818&utm_medium=email&utm_source=RD+Station

Estava na cozinha de casa durante o jantar com a TV ligada no Jornal Nacional quando vi o anúncio do resultado do julgamento da ADPF 324 quando meu filho perguntou o que era a tal “terceirização”. Daí você engole seco aquela pergunta e tenta explicar de forma didática para um pré-adolescente de 12 anos: Cheguei no seguinte modelo:

Imagine se a empresa X precise contratar o serviço que deve ser realizado pelo Fulano de Tal. Se a empresa X contratar diretamente o Sr. Fulano de Tal e pagar R$ 1.000,00 de salário para o empregado, a empresa X ainda vai ter de pagar ao Fisco algo entre R$ 750,00 a R$ 1.050,00 só pelo fato de ter cumprido toda a legalidade trabalhista exigida pelo simples fato da empresa X ter o Sr. Fulano no seu quadro de funcionários.
MAS… se a Empresa X contratar a Empresa Y para o mesmo serviço, a Empresa Y vai acabar contratando o Sr. Fulano por R$ 500,00 e a Empresa Y vai gastar no total um valor de no máximo de R$ 1.025,00 e vai ainda vender o serviço do Sr. Fulano para a empresa X por R$ 1.300,00.
Em tese ficam todos felizes. O Sr. Fulano por ter finalmete conseguido um emprego com salário subvalorizado no mercado porque a empresa Y o contrata com o discursinho mequetrefe de que tá difícil pra todo mundo,;
a Empresa X porque está economizando cerca de R$ 750,00 em impostos para o fisco;
a Empresa X vai ter o o serviço necessário sendo realizado; e
a Empresa Y porque acaba ganhando uns trocados sem ter produzido absolutamente nada além da pedalada nos direitos protetivos do trabalhador previstos pelo Art. 7º da nossa Constituição Federal.

Será que só eu estou confuso acerca do conceito de “constitucionalidade” ? Será que não caberia um pouco mais de discussão acerca do tema? Será que não cabe um olhar mais amplo sobre o problema real e de direitos?
Em tempos de crise, desemprego e desalento (*) crescentes, discutir as relações de trabalho me parece um caminho que deve ser parte da solução.
De que adianta haver direitos sociais garantidos ao trabalhador apenas na letra da lei se a praxis do mercado arranja um jeito para minorar o ônus dessa conta?
Será que nossas leis trabalhistas – e a jurisprudência – realmente estão protegendo os trabalhadores? Penso que o tema vale, no mínimo, a reflexão para discussão.

#my2cents.

Questões elementares sobre Direito Internacional

1- O que é Direito Internacional Público?

O direito internacional é um conjunto de princípios e normas que podem ser positivadas ou consuetudinárias que representam os direitos e deveres aplicáveis no escopo internacional das relações na sociedade internacional, seja envolvendo estados ou entidades infra estatais e suas relações extra-fronteiras. A sociedade internacional é formada por estados ou organismos internacionais e pelo homem. O direito internacional público trata as relações entre esses sujetitos, aplicando regras princípios e costumes internacionais e é formado por três elementos essenciais, denominados de “bases sociológicas”, a saber, a pluralidade de estados, o comércio internacional e os princípios jurídicos coincidentes.

Existem várias teorias para determinar os alicerces do Direito Internacional, vertendo-se em duas correntes, a saber, o das teorias voluntaristas e o das teorias objetivistas. As primeiras partem do princípio de que os alicerces do direito internacional estão vinculados à manifestação da vontade dos estados na submissão às regras acordadas entre os estados em seus tratados por consentimento ou conveniência. Já as teorias objetivistas defendem a obrigatoriedade das aplicações de normas e princípios superando, inclusive, as cartas constitucionais de cada estado já que expressão direitos e deveres relativos às relações internacionais suplantam as peculiaridades de cada estado em questão fazendo com que a norma seja preferencialmente observada seja por obrigação, solidariedade internacional ou por aplicação de garantias de direitos fundamentais.

2- O que são a Teoria Monista e a Teoria Dualista?

Segundo a teoria monista o Direito Internacional e o Direito Interno são dois ramos de um mesmo sistema e emanam de uma só fonte, formando um único direito com diferentes primazias. pode se dividir em 3 linhas de pensamento, a saber, o monismo com primazia do direito interno de viés nacionalista que ignora o direito internacional fazendo prevalecer sempre o Direito Interno; o monismo com primazia do direito internacional de caráter extremado faz com que o direito internacional seja colocado em posição de superioridade em relação ao direito interno; e o monismo com primazia do direito internacional moderado onde há prevalência do direito internacional admitindo exceções em certas vertentes materiais fazendo, nesses casos, manifestar superioridade de aplicação do direito interno.

A teoria dualista, por sua vez, faz distinção completa do direito interno e do direito internacional e são tratados como ordenamentos distintos e incomunicáveis. sendo aplicados cada um no que cabe a situação, sendo o direito interno formulado conforme a soberania do estado em questão e o direito internacional pelas acomodações de vontades dos estados em suas interrelações.

3- Quem são os sujeitos de Direito Internacional? Explique a situação do indivíduo.

O sujeito por excelência do Direito Internacional é o Estado. Define-se o estado, nas palavras de CASELLA, como “o estado como agrupamento humano, estabelecido permanentemente num território determinado e sob governo independente.”. O Estado é pessoa jurídica de direito público externo, com representação internacional, soberania e de ação igualitária em relação aos demais estados.

Podem figurar ainda como sujeitos de direito internacional as Organizações Internacionais que são pessoas de direito público externo formadas pela reunião de Estados com finalidades comuns.

Os indivíduos também podem figurar como sujeitos do Direito Internacional, apesar de serem tratados de forma sui generis em relação ao direito internacional. São dotados de direitos e deveres que são garantidos por Tratados Internacionais. As regras sobre os tratados foram estabelecidos pela Convenção e Viena sobre o Direito dos Tratados em 1969 e entraram em vigor efetivamente em 1980. É no campo dos direitos humanos que o indivíduo detém maior possibilidade de ser aplicado como sujeito de direito internacional.

A subjetividade do direito internacional é dependente da existência da Personalidade Jurídico-internacional e da Capacidade Jurídico-internacional. Há tendência, em especial sob as tratativas das violações aos direitos humanos, de enquadrar o indivíduo, bem como a humanidade, como possíveis sujeitos do direito internacional apesar de não haver ainda consenso ou mesmo pacificação doutrinária acerca do tema.

Há também, como sujeitos do direito internacional algumas organizações coletivas não estatais, tal como exemplo a Santa Sé (cúpula da Igreja Católica ocidental), que é um ente distinto do Estado do Vaticano, mas possui personalidade e capacidade jurídica-internacional.

4- Cite três organizações internacionais, explanando sucintamente sobre elas.

ONU: Organização das Nações Unidas, com sede em Nova York (EUA) tem o objetivo de aprimorar a representação dos estados mais fracos, pacificar os conflitos, apoiar o desenvolvimento econômico e zelar pelos direitos humanos. Foi criada em 1945 após o fim da II Grande Guerra e possui seis órgãos principais, a Assembleia Geral, o Conselho de Segurança, o Conselho Econômico e Social, o Conselho de Tutela, a Corte Internacional de Justiça e o Secretariado.

FMI: Fundo Monetário Internacional. Tem por finalidade prestar auxílio emergencial a países em crise econômico-financeira. Criado em 1945, é composto por 188 países membros e oferecem financiamentos aos estados por meio de um fundo contributivo formado por contribuições de cotas de seus membros.

BIRD: Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento. É uma organização internacional similar ao FMI que oferece empréstimos a países em desenvolvimento. É semelhante a um banco privado onde os estados-membros são seus acionistas.

Há outras organizações internacionais que poderiam ser citadas tais como a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), Organização dos Países Exportadores de Petrólio (OPEP), o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA) e o Mercado do Cone Sul (MERCOSUL).

5- Cite e explique sucintamente três princípios de Direito Internacional.

Princípio da não-agressão: é oriundo da idéia de que não é lícito iniciar agressão contra não-agressores, isto é, quaisquer entidades sujeitas ao direito internacional poderão ser passíveis de punição/sanção caso iniciem injusto ataque contra outro estado.

Princípio da autodeterminação dos povos: trata do direito de que cada povo detém o direito de se autogerir/autogovernar sem interferências à sua capacidade de decisões. Em termos de direito internacional implica em que um estado não deverá atuar de forma a fazer com que o povo de outro estado seja afetado em sua independência de ação e governo.

Princípio da igualdade soberana dos estados: Em sendo cada estado devidamente soberano, isto é, capaz de autogovernar-se sem quaisquer dependências ou subserviências a outros estados, com o poder de determinar sua organização jurídica no escopo de seu limite territorial fazendo valer ali, universalmente suas decisões, conforme dispõe as lições de Miguel Reale. O princípio da igualdade soberana dos estados está vinculada à associação da soberania dos estados e da não hierarquia entre os estados, sujeitos inerentes do Direito Internacional.

6- Cite e explique os meios diplomáticos de solução de controvérsias no Direito Internacional.

As soluções de conflitos internacionais podem se dar por diplomacia e negociação, onde há a tentativa de se solucionar o conflito de forma negociada através de relações diplomáticas entre os estados conflitantes; por meio de bons ofícios, quando um terceiro estado detentor de boa relação entre os entes litigantes atua de forma a aproximá-los e resolver a questão; por consulta onde as partes determinam nos próprios tratados como serão realizadas as negociações em eventual conflito; por mediação onde haverá atuação positiva de um terceiro estado para auxiliar a produção de uma composição do conflito entre os entes litigantes; por inquérito, isto é, um procedimento para identificação de um conflito iminente; por meios políticos onde há atuação expressa de uma organização internacional da qual os estados litigantes façam parte; por arbitragem extrajudicial da solução onde um árbitro ou câmara arbitral decide o conflito, com caráter vinculatório; por meio de corte internacional de justiça localizada em Haia, na Holanda, em que haverá litígio judicial da qual se proferirá sentença para se resolver o conflito ou ainda, por meio da guerra que será a aplicação do conflito com base em uso de forças militares, com imposição da vontade da parte vencedora.

7- Explique sucintamente os elementos que compõem a noção de Estado.

O Estado é composto por quatro elementos básicos, a saber, o Governo, o Território, a População e a Soberania. Sob a ótica do direito internacional, cabe dizer que ao elemento denominado Governo se indica sua estrutura funcional e sua distribuição e inter-relacionamento face aos poderes em estruturas compartimentadas – Executivo, Legislativo e Judiciário – e suas organizações institucionais/funcionais.

Ao elemento Território compreende uma determinada e fixada porção física de espaço onde o Governo exerce sua jurisdição de poderes, isto é, corresponde ao local onde atua de forma a garantir a eficácia de suas decisões.

Quanto à População, compreende-se neste os indivíduos que residem no território do estado em caráter permanente. Pode ser composto por nacionais e estrangeiros sendo o único critério efetivo para sua consideração é a fixação de residência em caráter permanente.

O elemento da Soberania, previamente abordado neste trabalho, corresponde ao poder de determinar sua organização jurídica no escopo de seu limite territorial fazendo valer ali, universalmente suas decisões (REALE, 1960);

8- Explique resumidamente as principais formas de surgimento de um Estado.

Os estados podem formar-se por fundação direta, onde há caráter originário da fixação da população em determinada área desocupada, criando ali a sua organização política conforme os quatro elementos elencados na questão anterior. É a forma adotada na formação dos estados da antiguidade clássica.

Podem ainda se formar por Emancipação, onde o estado é formado pela sua dissociação ou libertação face a estado colonizador dominante. Neste caso ocorre a formação de um novo estado independente originário de uma anterior colônia de outro estado; por Separação ou desmembramento onde um estado se divide formando a parte que se dissociou do estado anterior forma um novo estado independente. A diferença entre a Separação e a Emancipação é que, na separação a condição anterior do estado recém formado não era a de “colônia” do estado dominante e sim parte deste.

A contrario da separação, dois ou mais estados podem se fundir e por essa Fusão formar outro estado. Neste caso, os dois (ou mais) estados anteriores formarão um terceiro novo estado, deixando os dois anteriores de existir.

9- Explique a diferença entre deportação, expulsão e extradição.

Quando um indivíduo tenta entrar sem autorização em um determinado estado ou este, ainda que ingressando de forma autorizada neste estado mas sua permanência ali se tornou irregular, o referido estado pode deportar o indivíduo para seu país de origem. Já quando o indivíduo que entrou regularmente em um determinado estado e, por sua conduta, tornou-se nocivo no entendimento dos valores daquele estado, poderá haver sua expulsão daquele território por conta da natureza de sua conduta e relativa ao risco que este apresenta ao referido estado. Na extradição ocorre de um estado A requerer ao estado B onde se encontra um indivíduo nacional daquele (A) por ter esse indivíduo cometido algum ato ilícito no território do estado A.

10- Quais são as formas de reparação do dano no Direito Internacional? Explique.

As formas possíveis de reparação de danos em direito internacional são a restituição integral, a sanção interna, a reparação de natureza moral e a indenização.

Na restituição integral restitutio in integro procura-se retornar as coisas na forma em que se encontravam na forma anterior ao dano, se for possível. Caso não seja possível, caberá indenização.

Na sanção interna, pode ser solicitado ao estado realizar punição específica ao (s) agente (s) causador (es) do dano para fins de reparação.

A reparação de natureza moral compreende uma eventual manifestação formal do estado responsabilizado pelo ato ilícito tal como um pedido de desculpas.

Na indenização há a compensação material do dano direto. Via de regra não exclui a reparação por outros meios cumulados.

11- Quais são os mecanismos coercitivos de solução de conflitos, antecedentes ao conflito armado?

As organizações internacionais podem, caso as soluções pacíficas de conflitos não sejam eficientes, empregar os seguintes métodos coercitivos para a tentativa de evitar o conflito armado:

Retorsão que consiste em um estado empregar contra outro posicionamentos e decisões similares aos que contra ele foram adotados pelo outro estado litigante. Em termos populares seria equivalente ao “revide” ou “olho por olho, dente por dente”, isto é, repetir contra o ofensor a ofensa recebida.

Represália que consiste em adotar medidas reversas mais severas que a retro-aplicação de medidas equivalentes contra o estado ofensor, tal como interromper suas relações comerciais com o estado que iniciou o conflito.

Bloqueio que consiste em, por exemplo, impedir que outros estados mantenham relações (especialmente comerciais) com o estado ofensor, oferecendo a esses ameaças de represálias contra os estados terceiros que se relacionarem com o estado ofensor do que oferece o bloqueio.

Rompimento de relações diplomáticas, neste caso, cessam-se todos os relacionamentos políticos entre os dois estados litigantes. É provável que após a aplicação desse meio coercitivo a guerra seja uma mera questão de agenda e conveniência já que todo e qualquer tipo de “boa conversa” falhou previamente.

12- Cite e explique brevemente os crimes passíveis de julgamento pelo Tribunal Penal Internacional.

Decorre do Decreto 4.388/2002 que promulga o Estatuto de Roma do Tribunal Internacional a definição dos crimes que são passíveis de julgamento da competência, a saber, como consta em seu Art. , O crime de genocídio; Crimes contra a humanidade; Crimes de guerra; e crime de agressão.

Os Art. 6º, 7º e 8º do referido estatuto define a tipicidade dos referidos crimes, sendo um rol de condutas auto-explicáveis sendo taxados como Crimes de Guerra as Violações Graves do Direito Humanitário e às Convenções de Genébra de 1949, os Crimes Contra a Humanidade definidos com os derivados de ataques generalizado a civis e o genocídio como sendo atos diversos que objetivam a destruição de um determinado grupo por motivos tais como a nacionalidade, etnia ou religião. Além desses, podem ser considerados crimes passíveis de julgamento perante o Tribunal Penal Internacional os crimes de agressão ou uso de força contra a soberania de um determinado estado.

Referências

BRASIL, DECRETO Nº 4.388, DE 25 DE SETEMBRO DE 2002., Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4388.htm>;, Acesso em 25/09/2017.

CASELLA, Paulo Borba, Manual de direito internacional público / Paulo Borba Casella, Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva. — 20. ed. — São Paulo : Saraiva, 2012.

NEVES, Gustavo Bregalda, SÍNTESES ORGANIZADAS SARAIVA – Direito Internacional Público e Privado – n. 09/2009, São Paulo: Saraiva, 2009.

REALE, Miguel. Teoria do direito e do Estado. 2 ed. São Paulo: Martins, 1960;

SANCHES, Maria da Glória Pérez Delgado, REPARAÇÃO in Anotações de Direito Internacional, 2008, Disponível em http://pesquisasdiritointernacional.blogspot.com.br/2008/05/reparao.html, Acesso em 25/09/2017.

TROVÃO, Antônio de Jesus. Teorias monista e dualista em Direito Internacional. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, no 172. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/ doutrina/texto.asp?id=1175> Acesso em: 24 set. 2017.

Aplicabilidade do princípio contributivo-retributivo para o aposentado que volta a trabalhar – Direito previdenciário

Houve recente decisão da justiça de primeiro grau federal de SP que foi ratificada pelo TRF3, onde foi determinada a cessação do desconto de INSS da autora aposentada, em infringência expressa ao Art. 11, § 3º da Lei 8.123/91, e ao princípio da solidariedade presente no Art. 194CRFB/88 e a diversidade da base de financiamento prevista no Art. 195CRFB/88

A pergunta que se faz é se há ou não a aplicabilidade do princípio contributivo-retributivo?

A notícia figurou assim:

DAR E RECEBER

Aposentada que trabalha não deve ter descontos previdenciários no salário

30 de julho de 2017, 8h32

Se uma pessoa que se aposentou e voltou a trabalhar não tem direito aos benefícios que o INSS oferece, seu salário não deve ser descontado com encargos previdenciários. O entendimento foi usado pelo juiz federal Luciano Tertuliano da Silva, titular do Juizado Especial Federal Cível de Assis/SP (JEF/Assis), para condenar a União a restituir R$ 42.634,48 em contribuições descontadas da remuneração da trabalhadora aposentada.

Para o juiz, a cobrança da contribuição não deveria ser obrigatória uma vez que ao permanecer trabalhando e contribuindo para o Regime Geral da Previdência Social, depois de obter a aposentação, o INSS não concede garantias mínimas hábeis a assegurar proteção em relação à sua atual situação empregatícia.

“Se não há por parte da Previdência Social uma contraprestação apta a conferir aos segurados que se encontrem em idêntica situação uma proteção suficiente e adequada a todas as contingências sociais, indistintamente, não há razão para se exigir dos contribuintes aposentados empregados, segurados obrigatórios, as contribuições sociais incidentes sobre sua remuneração”, disse o juiz em sua decisão.

O juiz também determinou à empregadora da aposentada que, a partir da intimação, deposite em conta judicial os valores que viessem a ser descontados sobre a folha de salários e rendimentos da autora, a título de contribuição previdenciária, até o trânsito em julgado da sentença.

Precedente importante

O advogado especialista em Direito Previdenciário João Badari, sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados ressalta que, apesar de ser uma decisão em primeira instância, representa um reconhecimento de que não deve ser obrigatória a contribuição previdenciária para os aposentados que retornam ao mercado de trabalho.

“A posição do juiz demonstra que o princípio contributivo-retributivo da Previdência Social, previsto em nossa Constituição Federal, não está sendo levado em consideração. Atualmente, o aposentado que continua na ativa apenas contribui ao INSS e não consegue nenhum tipo de retribuição, ou seja, não consegue nenhum tipo de revisão do valor atual do benefício mensal”, diz Badari.[…]

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 30 de julho de 2017, 8h32, Disponível em <https://www.conjur.com.br/2017-jul-30/aposentada-trabalha-nao-descontos-previdenciarios?imprimir=1&g…;, Acesso em 19/10/2017.

Partindo dos pressupostos constitucionais, é no Art. 194 CRFB/88 e seguintes que se deve iniciar a busca dos fundamentos pelos quais se devem nortear as decisões acerca do tema e em sua interpretação aplicada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

“A contribuição de seguridade social possui destinação constitucional específica. A contribuição de seguridade social não só se qualifica como modalidade autônoma de tributo (RTJ 143/684), como também representa espécie tributária essencialmente vinculada ao financiamento da seguridade social, em função de específica destinação constitucional. [ADC 8 MC, rel. min. Celso de Mello, j. 13-10-1999, P, DJ de 4-4-2003.]”

A decisão dada pelo Juiz Federal, confirmada pelo TRF3 vai de encontro com o entendimento atual do STF sobre o assunto, a saber:

“Contribuição previdenciária: aposentado que retorna à atividade: CF, art. 201§ 4º; Lei 8.212/1991, art. 12: aplicação à espécie, mutatis mutandis, da decisão plenária da ADI 3.105, rel. para o acórdão Peluso, DJ de 18-2-2005. A contribuição previdenciária do aposentado que retorna à atividade está amparada no princípio da universalidade do custeio da previdência social (CF, art. 195); o art. 201§ 4º, da CF, “remete à lei os casos em que a contribuição repercute nos benefícios”. [RE 437.640, rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 5-9-2006, 1ª T, DJ de 2-3-2007.] = RE 372.506 AgR, rel. min. Gilmar Mendes, j. 7-2-2012, 2ª T, DJE de 23-2-2012”

O Art. 11 da Lei 8.123/91 trata dos segurados obrigatórios do regime comum de previdência social e, em específico, o seu § 3º determina que:

§ 3º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata a Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, para fins de custeio da Seguridade Social. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995)

As receitas que sustentam o fundo da Seguridade Social têm em sua composição, como prevê o Art. 11 da Lei 8.212/91, as contribuições sociais efetuadas obrigatoriamente pelos trabalhadores, incidindo sobre seus salários de remuneração (Art. 11, II c/c Art. 11, par. único, alínea c da Lei 8.212/91.

O trabalhador figura, nos termos do Art. 12Ia, da Lei 8.212/91 como segurado obrigatório mas, a condição de trabalhador aposentado limita sua percepção de benefícios ao que consta no Art. 18, § 2º, DA LEI 8.212/91, in verbis:

§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)

Considerando o rol de benefícios aos quais o segurado poderia perceber pelo que consta no Art. 18, Lei 8.212/91, excetuando-se aquele que este aposentado-trabalhador já percebe – a aposentadoria – há uma contraprestação da contribuição desproporcional para justificar a aplicação da contribuição compulsória combinada com a limitação dos benefícios dada pelo referido parágrafo.

Para o aposentado que se mantém fora do mercado formal de trabalho – se trabalha, não trabalha nas fileiras de empregos formais – entende-se inconstitucional o recolhimento de tal contribuição de seus proventos, como:

“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (Vide EC 20/1998)”

[…] 

“II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; (Redação da EC 20/1998)

• É inconstitucional a cobrança, na vigência da EC 20/1998, de contribuição previdenciária sobre os proventos de inativos e pensionistas, conforme jurisprudência firmada neste STF. A restituição dos valores das contribuições descontadas indevidamente deverá ser feita em valores atualizados, com juros de mora contados a partir do trânsito em julgado da sentença, conforme dispõe o parágrafo único do art. 167 do CTN. [RE 593.586 ED, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 6-10-2009, 2ª T, DJE de 29-10-2009.], = RE 585.919 AgR, rel. min. Luiz Fux, j. 22-11-2011, 1ª T, DJE de 13-12-2011”

Assim, ao que parece, para o STF ao aposentado que não trabalha nas leiras do mercado formal é injusto que participe do financiamento da seguridade social. 

A aplicabilidade do princípio da solidariedade para a sustentação da seguridade social, não está no rol de princípios previstos no Art.  da Lei 8.212/91. O que lá se encontra é o princípio da eqüidade na forma de participação no custeio. Tal qual o que se encontra também no Art. 194, V, CRFB/88. Não há expressão “solidariedade”em quaisquer dos dois dispositivos, seja o constitucional, seja o legal. 

Ao se agregar ainda a opinião do Min. Luiz Fux sobre a seguridade social, a saber:

“• A seguridade social prevista no art. 194 da CF/1988, compreende a previdência, a saúde e a assistência social, destacando-se que as duas últimas não estão vinculadas a qualquer tipo de contraprestação por parte dos seus usuários, a teor dos arts. 196 e 203, ambos da CF/1988.[RE 636.941, rel. min. Luiz Fux, j. 13-2-2014, P, DJE de 4-4-2014, rg.]”.

O que se tem, em termos de solidariedade, e por inferência, é que há implícito tal princípio e, possivelmente, apenas no que tange o assistencialismo perante a saúde e a assistência social. Não há tangência da solidariedade para as questões da previdência. O que há, de fato, é a presença do princípio da equidade na participação contributiva referente ao rateio de seus custos. 

Não existe almoço grátis! Este é um brocado comum que indica que em tudo haverá custos e haverá alguém para arcar com eles. 

Ainda que haja afronta direta da decisão proferida pelo Juiz Federal Luciano Tertuliano da Silva, no caso apud, ao dispositivo legal previsto no Art. 11, § 3º da Lei 8.123/91, remover a incidência da contribuição referente ao INSS para um aposentado que volta ao mercado de trabalho, nas leiras formais, me parece razoável do ponto de vista de justiça e não de legalidade. 

Encontra-se um ponto de incongruência a aplicação do princípio da equidade se forem tomados os dois personagens corolários das situações apresentadas, a saber, o aposentado que retorna às fileiras formais de trabalho e aquele que se mantém fora deste. A adaptação da aplicação da lei – dura lex – ao caso concreto – que é o real efeito do princípio da equidade – nos moldes da lei 8.212/91, em especial no que se refere ao entendimento atual do STF sobre o tema cria, necessariamente, uma equidade reversa.

Num sistema em processo de falência e desmantelado como é o caso da gestão da Previdência Social, achacar o aposentado que, ao invés de manter-se usufruindo de sua condição de beneficiado, opta por retornar às fileiras de trabalho formal, o faz provavelmente não por desejo mas por carência e tem esse de agradecer aos céus por ter conseguido alguma recolocação formal de trabalho – cousa rara de se obter hoje em dia – fazer com que tenha este de contribuir para o benefício de outrem é, no mínimo, imoral. Tais contribuições se darão apenas para satisfazer o princípio da “solidariedade” – que nem está explícito de forma literal no Art. 194 CRFB/88 – e o princípio da diversidade da base de custeio, mas excluindo-se o princípio da “equidade”nessa participação (Art. 194, V, CRFB/88). 

Não há de se pensar plausível ou razoável que o aposentado passará a procurar emprego se não houver em sua história alguma necessidade que o benefício não consiga cobrir. É de tempos longínquos que o trabalho é encarado como um peso a ser enfrentado pelo ser humano. O trabalho decorre dos tempos da sentença proferida por Deus, a Adão e Eva ao expulsá-los do paraíso (Gn. 3, 17-19) por sua desobediência, “Comerás o pão com o suor de seu trabalho”

“17 ad Adam vero dixit quia audisti vocem uxoris tuae et comedisti de ligno ex quo praeceperam tibi ne comederes maledicta terra in opere tuo in laboribus comedes eam cunctis diebus vitae tuae” (VULGATA, Disponível em http://www.academic-bible.com/en/online-bibles/biblia-sacra-vulgata/read-the-bible-text/bibel/text/l… )

Não é razoável pensar que um aposentado vá em busca de um “castigo divino” senão por pura necessidade. 

É possível arrazoar que tal decisão proferida pelo Juiz Federal, e confirmada pelo TRF3, realmente fere princípios constitucionais? Penso que a resposta é efetivamente negativa posto que tal decisão encontra abrigo no princípio previsto no Art. 194, V, CRFB/88, a saber, o da equidade na participação do custeio da seguridade social. E decorre de um raciocínio razo e até simplista da realidade dos fatos e da própria incongruência de decisões justas, daquelas inclusive já apresentadas. 

Em sendo inconstitucional a cobrança da contribuição previdenciária daquele que já se encontra absorvendo os benefícios da aposentadoria no que se refere ao custeio da seguridade social da sociedade (RE 593.586, RE 585.919); em não havendo aproveitamento de quaisquer benefícios além do salário família e da reabilitação profissional prevista no Art. 18, § 2º, DA LEI 8.212/91; e aplicando-se apenas a incidência de tal cobrança apenas ao aposentado-trabalhador, que normalmente volta a trabalhar por questões de necessidade, conclui-se que a decisão do referido juiz federal encontra lastro no princípio da equidade, é moralmente aceitável e deve ser devidamente defendida para aqueles que anseiam pela aplicação do conceito de justiça apesar de essa decisão ser contrária ao texto da lei e ao entendimento atual do Supremo Tribunal Federal acerca de tal assunto. 

O que tem de mudar, nesse caso, é a lei e, a posteriori, o entendimento da suprema corte para que tenha compatibilidade com as possíveis mudanças legislativas sobre o assunto.

Referências

BRASIL, Lei 8.212/1991 – Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências., 24/07/1991, Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8212cons.htm, Acesso em 20/10/2017. 

BRASIL, Lei 8.213/1991 – Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências., 24/07/1991, Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8213cons.htm, Acesso em 19/10/2017.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal (STF), A Constituição e o Supremo [recurso eletrônico] / Supremo Tribunal Federal. – 5. ed. – Brasília : Secretaria de Documentação, 2016.

_____, Bíblia Sacra Vulgata, Gênesis, Cap. 3 in Academic-Bible.com, GERMAN BIBLE SOCIETY, Disponível em http://www.academic-bible.com/en/online-bibles/biblia-sacra-vulgata/read-the-bible-text/bibel/text/l…, Acesso em 22/10/2017.

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